Workshop debate como modelo de gestão transforma incubadoras em catalisadoras de empreendedorismo inovador no BrasilFoz do Iguaçu – PR, 15 de outubro de 2025 – A certificação CERNE (Centro de Referência para Apoio a Novos Empreendimentos) consolidou-se como muito mais do que um simples selo de qualidade para incubadoras brasileiras. Durante o Workshop 4 da 35ª Conferência Anprotec, realizado na manhã desta quarta-feira (15) em Foz do Iguaçu, gestores de ambientes de inovação demonstraram como o modelo, quando aplicado estrategicamente, transforma não apenas processos internos, mas reconfigura ecossistemas inteiros de empreendedorismo e inovação.Sob o tema
“Inovação colaborativa e Certificação CERNE: fomentando ecossistemas de inovação globalmente integrados”, o painel moderado por Adriana Ferreira de Faria, presidente da Anprotec, reuniu vozes representativas do ecossistema nacional para discutir os impactos tangíveis da certificação sobre a governança, a gestão da inovação e a articulação entre os diversos atores que compõem as redes de apoio ao empreendedorismo. Segundo Adriana, o CERNE é hoje uma das principais ferramentas de fortalecimento da governança e da sustentabilidade dos ambientes de inovação, por oferecer uma metodologia de gestão que profissionaliza as incubadoras e amplia sua capacidade de gerar negócios inovadores e de impacto.
Do laboratório à empresa: CERNE potencializa conexão entre pesquisa e mercado
A discussão iniciou com uma perspectiva macro do ecossistema brasileiro de ciência e inovação. Marcio Ramos de Oliveira, coordenador-geral de Promoção à Inovação e ao Transbordamento do Conhecimento do CNPq, destacou o papel estratégico das incubadoras certificadas no Programa RHAE (Programa de Formação de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas), iniciativa com quase 40 anos de história que busca inserir mestres e doutores em projetos de PD&I dentro de empresas. Criado em 1987 pelo MCTI em parceria com o CNPq, o programa tem o objetivo de formar e capacitar recursos humanos altamente qualificados para atuar em projetos de pesquisa aplicada e de desenvolvimento tecnológico nas empresas, ampliando a interação entre universidades e o setor produtivo. Em sua última chamada, aprovada em janeiro de 2025, foram contempladas 248 propostas com investimento superior a R$ 68 milhões (dados do CNPq, Chamada RHAE 2025).
Para Marcio, a certificação CERNE atuou diretamente nessa iniciativa, ao oferecer ambientes mais preparados para receber pesquisadores e desenvolver projetos complexos, colaborando para conectar incubadoras e facilitando a identificação de empresas aptas a receber bolsistas e recursos. Essa visão reforça o papel do modelo como um indicador de maturidade institucional que aproxima universidades, agências de fomento, pesquisadores e empresas.O contexto apresentado pelo CNPq é revelador de um desafio estrutural brasileiro. Enquanto o país ocupa a 13ª posição no ranking mundial de produção científica, figura apenas na 49ª posição em inovação. Em países referência, como China, Alemanha e Coreia do Sul, mais de 50% dos doutores trabalham em empresas; no Brasil, esse percentual não chega a 20%. É nesse vácuo que incubadoras certificadas pelo CERNE podem atuar como pontes estruturantes entre o conhecimento científico e a inovação de mercado.
A escada da evolução contínua
Jucelia Maria Lopes Maia Roberto, coordenadora do tecnoPARQ – Parque Tecnológico de Viçosa, trouxe ao debate a perspectiva de quem atingiu o patamar máximo de certificação. Gestora de uma incubadora CERNE 4, ela explicou que o modelo representa uma jornada de evolução contínua: “a ideia da escada é uma forma de permitir que a incubadora implemente gradualmente melhorias e amadureça seus processos, consolidando uma cultura de crescimento permanente”.
O modelo CERNE está estruturado em quatro níveis crescentes de maturidade, sendo que cada nível é acumulativo — para implementar o CERNE 2, a incubadora precisa ter implantado as práticas do CERNE 1; para o CERNE 3, são necessários os níveis 1 e 2; e assim sucessivamente. Essa arquitetura escalonada reflete a compreensão de que a maturidade organizacional é construída de forma progressiva e contínua.Jucelia ressaltou ainda que o processo não é cíclico, mas dialético: cada nível agrega novas dimensões sem abandonar as anteriores. No
CERNE 4, por exemplo, a instituição atinge maturidade para atuar em redes globais e promover a internacionalização de suas empresas associadas. Segundo a gestora, a certificação máxima “não é um ponto de chegada, mas a consolidação de uma cultura viva de melhoria contínua que se renova a cada ciclo”.
Da desordem sistêmica à gestão estratégica
A experiência relatada por Wilmar Ribeiro Júnior, coordenador da Incubadora Santos Dumont do Itaipu Parquetec, ilustra a transformação que a certificação pode provocar em ambientes de inovação. O parque iniciou sua jornada CERNE em 2013, com a obtenção do nível 1 — um marco que o gestor identifica como divisor de águas na estruturação institucional. Ele explicou que, antes da certificação, “os processos eram soltos, sem uma análise sistematizada, o que gerava perdas na prática”. Com o guia do CERNE, segundo ele, foi possível organizar e dar direção às ações, “sem engessar, mas trazendo clareza sobre o que fazer e como evoluir”.
Wilmar destacou que a certificação precisa ser encarada como um processo de transformação, e não apenas como um selo. “Não se pode olhar o processo de certificação apenas por certificar; é necessário mudar a visão com relação a crescimento e futuro.” Sua fala sintetiza a essência do modelo: a certificação é um meio para construir capacidade institucional, integrando pessoas, processos e propósito.
Sistematização como estratégia de adaptação global
Flaviano Gastão Júnior, especialista em Inovação, Gestão de Pessoas, Estratégias e Negócios da F2 Conexões+Inovação, trouxe ao workshop uma perspectiva voltada à adaptação dos ambientes de inovação à economia digital globalizada. Em um mundo onde tecnologia e inovação conectam todos os agentes econômicos em tempo real, modelos de negócio precisam se adaptar continuamente — e as incubadoras não são exceção.
Flaviano destacou o papel do CERNE durante a pandemia de COVID-19, período em que muitas incubadoras precisaram digitalizar seus processos de forma acelerada. Ele lembrou que “um dos propósitos do CERNE é sistematizar boas práticas, e isso é essencial para crescer”, ressaltando que a estrutura metodológica do modelo permitiu às instituições adaptar-se rapidamente sem perder qualidade ou coerência.Essa visão reforça um ponto importante: é a estrutura que permite flexibilidade. Em ambientes de alta volatilidade, a sistematização oferece a base necessária para inovar com agilidade e segurança. Incubadoras sem processos claros enfrentam dificuldades não apenas para escalar, mas também para se reinventar diante de novos desafios.
Um ecossistema em expansão
Atualmente, das mais de 400 incubadoras, aceleradoras e parques tecnológicos associados à Anprotec, apenas 12 possuem o CERNE 4, o nível máximo de maturidade. O número revela tanto o caráter desafiador da certificação quanto o vasto potencial de crescimento do ecossistema brasileiro de inovação.
Recentemente, o Metrópole Parque, do Instituto Metrópole Digital da UFRN, tornou-se a primeira incubadora do Norte, Nordeste e Centro-Oeste a conquistar o CERNE 4, rompendo uma concentração que até então existia exclusivamente nas regiões Sul e Sudeste. Para Adriana Faria, “essa conquista simboliza a capilarização do modelo e mostra que a excelência em gestão de ambientes de inovação não é privilégio geográfico, mas resultado de comprometimento institucional”.
Perspectivas: do local ao global
O workshop evidenciou que a certificação CERNE está entrando em uma nova fase de maturidade. Não se trata mais apenas de estruturar processos internos de incubadoras, mas de utilizá-la como plataforma de articulação de ecossistemas complexos que transcendem fronteiras geográficas.
A conexão do CERNE com programas como o RHAE do CNPq ilustra essa dimensão sistêmica: incubadoras certificadas tornam-se nós estratégicos em redes que conectam pesquisa universitária, talentos qualificados, recursos financeiros e demandas empresariais. A sistematização de processos facilita não apenas a gestão interna, mas também a comunicação e a cooperação entre instituições heterogêneas.Em um cenário global onde inovação aberta e colaboração interinstitucional definem vantagens competitivas, a capacidade de operar segundo padrões reconhecidos torna-se ativo estratégico. O CERNE, ao estabelecer uma linguagem comum e referências compartilhadas, cria condições para que incubadoras brasileiras dialoguem de igual para igual com ambientes de inovação de outras regiões do mundo.Os relatos apresentados no Workshop 4 demonstram que o Brasil dispõe não apenas de um modelo robusto de gestão de incubadoras, mas de uma metodologia que pode ser referência internacional. A certificação CERNE emerge, portanto, como muito mais do que ferramenta de gestão — ela representa uma estratégia nacional de qualificação dos ambientes de inovação, essencial para que o país converta sua capacidade científica em impacto econômico e social concreto.
Sobre a 35ª Conferência AnprotecA 35ª Conferência Anprotec acontece de 13 a 16 de outubro de 2025, em Foz do Iguaçu (PR), com o tema
“Ecossistemas colaborativos e integrados à inovação global”. Promovido pela Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), o evento tem realização local do Sistema Estadual de Ambientes Promotores de Inovação do Paraná (Separtec), Fundação Araucária, Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) e Governo do Estado do Paraná.