Na tarde de ontem (1/8), a presidente da Anprotec, Adriana Faria, esteve presente no painel “Ecossistemas de Inovação no Brasil: Avaliação e Perspectivas”, que é parte da 5ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI).
Também participaram do encontro Rodrigo Quites, diretor-presidente da Fundação Guamá e líder do Comitê Científico da Conferência Anprotec 2024, Raul Lima (USP) e Silvio Bitencourt da Silva (Tecnosinos – Unisinos). Maurício Guedes (UFRJ, SEDEICS – RJ e ex-presidente da Anprotec) foi o relator do tema, e a coordenação da mesa ficou a cargo de Jorge Audy (PUCRS, IASP e ex-presidente da Anprotec).
O painel trouxe diferentes perspectivas sobre a avaliação e as perspectivas dos ecossistemas de inovação no Brasil, além de explorar os avanços e desafios enfrentados pelo país na construção de um ambiente propício à inovação, essencial para impulsionar o desenvolvimento econômico e social sustentável.
Dando início à discussão, Jorge Audy fez um apanhado do conteúdo abordado nas reuniões preparatórias da Conferência, realizadas no primeiro semestre deste ano, que trataram sobre a relação dos ambientes de inovação com as instituições de pós-graduação.
Para Audy, as discussões dos primeiros encontros identificaram os principais desafios sob o ponto de vista das parcerias entre universidades e ambientes de inovação. Dentre os tópicos levantados, destaca-se a dependência do financiamento público, que não é suficiente para fomentar um cenário inovador e competitivo. Outro ponto mencionado foi a irregularidade do financiamento, que ele citou como ‘modelo de rajadas’.
“Nesse modelo, temos épocas com bastante investimento dedicado, mas que são seguidas de períodos de muitos anos sem dinheiro algum para a inovação. Precisamos de um plano contínuo. Na área de parques tecnológicos, passamos dez anos – de 2013 a 2023 – sem nenhum tipo de edital ou apoio significativo. A continuidade é muito importante neste sentido”, apontou Audy.
Audy também enalteceu a retomada das Conferências Nacionais de CT&I, ressaltando que o próprio Centro de Gestão de Estudos Estratégicos (CGEE), organizador da iniciativa em 2024, nasceu na última edição do evento. O ex-presidente da Anprotec encerrou sua fala reforçando a importância dos ambientes de inovação. “Caminhar pelos parques tecnológicos é poder ver no presente o que será parte do futuro. Hoje, 8 das 10 maiores empresas do mundo nasceram ou passaram por ambientes de inovação”, defendeu.
Seguindo com o painel, Adriana Faria traçou um panorama sobre o cenário atual dos ambientes de inovação no Brasil, destacando que uma compreensão correta do ecossistema de inovação e empreendedorismo deve considerar que a inovação ocorrerá através de redes interativas, entre uma vasta e complexa gama de atores públicos e privados.
“Quando falamos em ecossistemas, é preciso ter em mente o significado do termo ecossistema, que remete a uma relação de interdependência. Os parques tecnológicos precisam das empresas graduadas pelas incubadoras, que possivelmente tenham crescido com o apoio de uma aceleradora. Em seu conjunto, os ambientes de inovação fornecem os recursos, a infraestrutura e o apoio necessário para que os atores do ecossistema possam colaborar e desenvolver seus projetos e empresas”, afirma Adriana.
A presidente da Anprotec ressaltou também a importância da educação como um fator fundamental para o desenvolvimento da inovação. Neste sentido, ela cita a tripla hélice como um modelo de integração entre diferentes atores com o objetivo de promover a inovação e o empreendedorismo.
Segundo Adriana, é necessária uma política de educação de qualidade mundial para além de partidarismo e ideologias, com a inclusão de inovação e empreendedorismo junto ao sistema nacional de avaliação da educação superior. Ela cita também que é importante priorizar áreas tecnológicas estratégicas, considerando desenvolvimento e equidade.
Rodrigo Quites abordou os desafios enfrentados pelos ambientes de inovação na Amazônia e como a região possui um grande potencial para contribuir com o desenvolvimento da inovação no Brasil, mas que, no entanto, é necessário explorar essas possibilidades respeitando os aspectos locais.
Quites apontou que as regiões do Brasil tratam o tema da inovação enfrentando desafios de diferentes naturezas, enquanto a Amazônia precisa lidar com os desafios da bioeconomia e sustentabilidade. As outras regiões mais industrializadas precisam lidar com a resistência às mudanças em setores mais tradicionais da economia.
“O desenvolvimento econômico da Amazônia não caminhou ao lado do desenvolvimento social. Muitos dos grandes empreendimentos em energia, polos industriais, mineração e agropecuária não consideram os aspectos socioambientais relevantes para a região. Na Amazônia, antes das startups, temos as comunidades e territórios que precisam de apoio de C,T&I. Proteger essas comunidades, apoiando e qualificando sua forma de sustento, é tão urgente quanto proteger as árvores”, provocou Quites.
A questão da legislação e normatização dos ambientes de inovação foi o tópico tratado por Silvio Bitencourt. Ele citou que muita da infraestrutura está pautada em legislação de estímulo e incentivo a atores específicos ou ao ecossistema como um todo. Para Bitencourt, é importante a criação de normas e regulamentos que orientem a conduta em determinadas áreas, frequentemente utilizadas em contextos jurídicos, administrativos e técnicos.
Sílvio destacou a importância das normas para a gestão da inovação, desmistificando a ideia de que elas são inimigas do progresso. “As normas ABNT da série ISO 56000 fornecem uma estrutura sólida para a inovação, promovendo eficiência e alinhamento com padrões internacionais. Elas não limitam a criatividade, mas sim facilitam a implementação de práticas inovadoras de forma organizada e sustentável, essencial para a competitividade das empresas brasileiras no mercado global”, afirmou.
O gestor do Parque Tecnosinos também ressaltou a necessidade de termos políticas orientadas a objetivos e com maior integração. “Necessitamos de políticas transformativas, que promovam mudanças significativas em áreas sociais, econômicas, ambientais e políticas. Essas políticas devem abordar desigualdades estruturais, promover a inclusão e buscar melhorias sustentáveis nas condições de vida da população. Além disso, elas precisam ser mais integradas. As áreas estratégicas definidas pela indústria precisam ser as mesmas da educação e a formação de pessoas, por exemplo”, afirmou Bitencourt.
Concluindo o painel, Raul Lima discorreu sobre o papel das DeepTechs no ecossistema de inovação e no desenvolvimento de soluções para a sociedade. Lima iniciou seu discurso introduzindo que o termo DeepTech refere-se a uma classe de empresas nascentes que desenvolvem novos processos ou produtos baseados em resultados científicos ou significativos na engenharia.
Para Lima, as DeepTechs são o exemplo prático de como a presença de pesquisadores em empresas pode gerar soluções inovadoras. Ele citou que, para que ocorra essa cocriação, é necessária uma interlocução entre pesquisadores da academia e do setor privado, e que eles devem trabalhar de maneira próxima.
“As DeepTechs precisam de infraestrutura especializada, com P&D rigorosos, longos períodos de investimento e laboratórios na fronteira das técnicas de medição. Um ambiente de inovação aberta com governança especializada que aproxime os atores da tripla hélice também é fundamental”, apontou.
Por fim, Maurício Guedes, em seu discurso de encerramento, reforçou as ideias apresentadas pelos palestrantes, enfatizando um aspecto presente nas apresentações anteriores: a conexão entre as instituições.
“Não podemos continuar acumulando mestres e doutores nas universidades, o concurso público não pode ser a única alternativa para essas pessoas. Precisamos dessa mão de obra especializada nas empresas, produzindo soluções para a sociedade. Por meio de redes e conexões, podemos conseguir melhores resultados”, concluiu.
A CNCTI deste ano aborda o tema “Ciência, Tecnologia e Inovação para um Brasil justo, sustentável e desenvolvido”.
O painel completo está disponível neste link.