Depois de dez anos de mercado, o empresário Gustavo Cadurim de Oliveira, de 41 anos, e seus dois sócios comemoram o sucesso do modelo de negócio escolhido por eles.
Com nanotecnologia na elaboração de fórmulas de medicamentos, cosméticos e suplementos alimentares mais eficientes, a equipe instalada no Supera Parque, polo de inovação em Ribeirão Preto (SP), registra uma expansão anual de 20% no faturamento graças a clientes de todo o país, além de Argentina, Chile e Colômbia.
A trajetória bem sucedida é o que representantes do setor de inovação apontam como uma maturidade alcançada pelas startups de Ribeirão Preto, em 2017 listada entre as 14 maiores cidades empreendedoras do país, segundo levantamento da Endeavor Brasil.
Entre as mais avançadas e as que ainda abrem mercados com novas ideias, as 75 empresas do parque faturaram 138,8% mais em dois anos, além de colocarem em evidência um crescente potencial para geração de empregos.
“A gente vem nos últimos três anos investindo bastante na nossa estrutura e equipe e agora a gente começa a colher esses frutos”, afirma Oliveira, fundador da Lipid.
Faturamento em alta
De acordo com relatório recém-divulgado pelo Supera Parque, as empresas instaladas no complexo saltaram de R$ 6,7 milhões em ganhos em 2016 para R$ 16 milhões em 2018, com uma média de crescimento superior a R$ 4,6 milhões por ano.
A ascensão é atribuída não só ao maior número de startups do parque – com crescimento de 33,9% -, mas também ao desenvolvimento dos negócios, que já superaram etapas de validação e de investimentos iniciais.
No início deste ano, o centro de inovação do interior de São Paulo esteve entre as 125 instituições de todo o mundo indicadas em uma das categorias do Prêmio da Cúpula Mundial para a Sociedade da Informação, ligada à ONU.
“A gente teve aumento no número e na maturidade das empresas aqui instaladas. As empresas tiveram uma evolução positiva e com isso conseguiram conquistar clientes e vender. Isso fez com que o faturamento fosse maior”, afirma Eduardo Cicconi, gerente do Supera.
Isso aconteceu mesmo diante de um orçamento menor da Fundação Instituto Polo Avançado em Saúde (Fipase), responsável pela gestão do Supera Parque e pela captação de recursos na iniciativa privada e em organismos de fomento. De R$ 8,1 milhões obtidos em 2016, a folha caiu para R$ 6,1 milhões em 2017 e para R$ 5,8 milhões em 2018.
“Nos últimos três anos, a quantidade de editais e recursos de fomento disponíveis pra captação, investimento nas startups no próprio ambiente do parque, caiu bastante, pela crise que o Brasil passou”, explica Cicconi.
Startups como as de Oliveira, com inovações em saúde, incluindo biotecnologia, cosméticos, equipamentos médicos, hospitalares e odontológicos, são os carros-chefe do centro de inovação e representam 53% das empresas do parque.
“Tenho empresas que trabalham com acompanhamento de pacientes, que utilizam inclusive inteligência artificial para fazer o acompanhamento remoto desses pacientes que possuem doenças crônicas. Tenho outras empresas que desenvolvem sistemas que trabalham com diminuição das perdas e dos riscos relacionados a gestão hospitalar, de unidades de saúde, e empresas que trabalham com cosméticos, desenvolvimento de novas soluções e formulações”, exemplifica o gerente.
Na sequência, aparecem empresas abertas a partir de ideias voltadas ao agronegócio, que abarcam em torno de 25% das startups. Tecnologia da informação e educação também integram o rol de atuação do Supera.
“A gente tem também um crescimento grande com sistemas na área de gestão do agronegócio, mas também tem muita tecnologia focada no que a gente chama de ‘pra dentro da porteira’, tecnologias embarcadas em máquinas agrícolas para fazer monitoramento.”
Geração de empregos
Tantas ideias e soluções demandam mais profissionais especializados. O balanço do Supera indica um crescimento de 69% nas contratações entre 2016 e 2018, com 338 postos de trabalho ocupados por pessoas com pós-graduação, mestrado e doutorado em áreas como biotecnologia, química, engenharia, entre outras.
Pela proximidade, a USP é a principal fornecedora de mão-de-obra qualificada – em torno da metade dela passou pela instituição, segundo Cicconi -, mas as parcerias se estendem a outras universidades da região em áreas como desenvolvimento de sistemas, ciência da computação e design.
“Nossa atuação não é só local, é uma atuação regional. A gente acaba interagindo muito com a Unesp de Jaboticabal”, exemplifica o gerente do parque.
Biólogo formado na USP, com mestrado, doutorado e três pós-doutorados na área de entomologia – estudo de insetos – e ecologia, inclusive no exterior, o empresário Túlio Nunes, de 35 anos, integra uma equipe com nove profissionais, entre biólogos, economista e zootécnico, em uma startup que atua com o controle natural de pragas na agropecuária.
Fundada em 2015, a empresa ainda está em fase de registro como um aplicado ao carrapato do boi. Os testes são feitos por parcerias com produtores, que remuneram o desenvolvimento e a pesquisa.
“O controle biológico é uma forma de a gente controlar as pragas sem usar veneno. A gente usa ecologia em vez do veneno, estuda a vida da praga, descobre quem são os inimigos naturais dela, volta para o laboratório, produz esses inimigos naturais e os utiliza para controlar pragas”, explica Nunes, cofundador da Decoy Smart Control.
Nos últimos três meses, a ajuda de custo dos produtores associados triplicou graças a um aumento de exposição da empresa diante de um mercado com alta demanda e da ineficiência dos carrapaticidas convencionais, segundo Nunes. Com o o laboratório dentro do Supera, a startup tem o potencial de desenvolver o tratamento para 75 mil animais.
Produtos voltados à linha pet também estão na mira da startup, que recentemente conseguiu a aprovação de um aporte de R$ 450 mil em um programa de fomento do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). Além disso, a empresa espera contar com R$ 1 milhão de um fundo de investimentos de Belo Horizonte (MG) para expandir suas atividades.
Para Nunes, ao mesmo tempo que contam com investimentos à disposição, os novos negócios esbarram em questões culturais e burocráticas do país.
“A gente consegue perceber várias iniciativas de incentivo para startup. Instituições mais tradicionais como a Fapesp [Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo], que antigamente tinham incentivo financeiro para pesquisa de base hoje têm voltado o incentivo financeiro para o desenvolvimento de inovação tecnológica. A maior dificuldade é com relação ao ineditismo do ecossistema, que é ainda muito recente. O Brasil não está acostumado, não tem um ecossistema maduro do ponto de vista da inovação tecnológica”, diz.
Hora de expandir
A expansão também norteia as expectativas do laboratório de Gustavo Cadurim de Oliveira. Além de uma parceria com um grande laboratório que pode ampliar em 100% o faturamento, a empresa planeja inaugurar este ano uma fábrica dentro do parque tecnológico para potencializar a produção de medicamentos e cosméticos com menos efeitos colaterais e melhores aspectos sensoriais usando apenas ingredientes naturais.
“É uma inovação grande da Lipid. Dela surgiu uma spin-off [empresa derivada de outra] que vai fabricar produtos a base de nanotecnologia no Brasil.”
Iniciativas como essa aceleram a expansão do parque tecnológico instalado em uma área de 378 mil metros quadrados concedida pela USP.
Depois de uma primeira fase com investimento inicial que resultou na abertura dos dois prédios onde as startups funcionam, o complexo está em vias de regularizar a liberação de lotes para a instalação de novas empresas.
“As salas disponíveis que a gente tem já estão todas tomadas. A gente precisa iniciar essa fase de expansão para várias empresas e lotes até para que o parque possa construir outras estruturas”, afirma Cicconi.
(G1)